sábado, 28 de dezembro de 2019

livreto da inquietação II


aceitar é preciso
a brandura e a virulência das ondas
a colmeia mel e o ferrão abelha
as férias dos pirilampos
compreender não é preciso

pessoa escreveu um livro inteiro desassossego
[composto por um ajudante de guarda-livros]
     eu engulo suspiros
     e regurgito confusão

como quase qualquer pessoa
na lerda larva da solidão
em uma balsa confiada à aleatória intensidade
das marolas e dos vagalhões
bem poderia escrever um livro de sublimes inquietações

mas me jogo
pulo
salto
lava
e gelo
ao sopro do ar de nem sei quem
pairo no éter
pena presa às correntes do vento

no ar invagino
a epiderme para dentro
os bofes para fora
           [que é preciso guardar em algum canto
            alguma autoproteção]

e em vez do desassossego sossegado
[e ergo o livro sincero profundo e vão]
espero
espero
espero
que a alma estenda suas asas e revele
e lave
e leve a embarcação

espero com o coração na mão
à mostra
sem pudor ou timidez
batendo bumbo no compasso em que o mar bate no chão
para quem quiser parar para ver
o bicho vermelho rubro
com suas propostas e projetos
tintos de sangue

e com os bofes de fora vejo a cena
e me assombra como alguém solto no ar do sopro de outrem
esteja tão bem aprumado ali na feira das parcerias
com o coração sem preço na mão
para quem quiser admirar sem tocar

andrejcaetano
Francesca Woodman


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