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Reiko Imoto |
do nada subiu um vazio
que nos cumprimentou serelepe ‘ei!’ e perguntou ‘e aí, o que vamos fazer?’
ficamos olhando aquilo,
pasmos, boquiabertos...loucura? tapando o nada, o Vazio logo se estabeleceu explanando
‘vocês sabem, não é?, no momento em que fizermos alguma coisa eu inexisto, pelo
menos temporariamente, porém, se, e somente se, a coisa, o que quer que seja, for
divertida, prazerosa e insuficiente’
no vácuo ficamos,
entendendo nada, essa não-coisa aerada e falante, boquirrota, demandante,
queria diversão e prazer para a sua própria inexistência?
não conseguíamos abrir a
boca, muito menos falar – mas estava engraçado ouvir o Vazio falar sobre
preenchimento do vazio
o Vazio coçava o queixo
que não tinha quando alguém perguntou ‘peraí, esse vazio aí é de quem?’
nos entreolhamos esperando
ver alguém com expressão de cachorro que soltou pum na igreja, mas outro perguntou
arisco ‘coisa, você é o vazio de quem aqui?’
‘como é que vou saber,
se sou vazio? não faço ideia...além do que, posso ser a soma de todos os seus vazios,
isso não tem a menor importância, o que interessa é o que vamos fazer – o que
vamos fazer?’
‘o que você quer fazer,
Vazio?’, perguntou um outro
‘sou apenas o vazio, eu
mesmo não faço nada, aliás, nisso que vocês mal veem nem eu há, ou melhor, o eu
que há não é meu – além do que, logo desapareço se fazem alguma coisa, mas só
se essa coisa for divertida, prazerosa e insuficiente, lembrem-se’
‘isso é genérico!’
exclamou um outro inconformado
‘diversão e prazer comungados
não têm nada de generalidade; pode ser raro, mas é preciso e suficiente’
‘suficiente como, se
você falou que tem que ser insuficiente?’
‘é preciso e suficiente
para não ser genérico; a insuficiência do divertido e prazeroso é outra coisa,
é nada-vazio-falta, tipo tesoura-pedra-papel: na presença do Vazio o nada é
tesoura cega; havendo falta o vazio é um seixo sendo embrulhado e reembrulhado
no movimento – like a rolling stone, if you know what I mean’
‘ahn?!’, insclamou outro,
‘além de complicado, fala inglês?’
‘eu falo qualquer língua, morta, viva ou ainda por nascer’, falou o Vazio com muita preguiça de ter
que explicar o óbvio, ‘mas então, o que vai ser?’, perguntou de novo
um outro troçou ‘sexo!
grupal!’ – parte arregalou os olhos, parte salivou
‘não’, disse o Vazio,
‘vocês não estão entendendo, não é ter uma experiência, inédita, é fazer alguma
coisa divertida e prazerosa, maturada na falta...’
um mais de saco cheio propôs,
‘que tal jogarmos essa coisa dentro do nada!’
‘à vontade’, sorriu o
Vazio, ‘mas, como fui dito, na minha presença nada não há – se é que vocês já
me experimentaram...’, o que fez o Vazio ruminar ‘deve ser mesmo complicado
entender o que semidigo’ e tentou novamente: ‘pessoal, olha só, não é todo
mundo junto, é só o Um, que são dois: o zero e o um – nem é neste-instante-agora, é para abrir a porta, ou o que quer que lhes soe fechado, do começo’
siiiii
lêêêêên
cio
de onde uma voz mezzo
verdadeira mezzo zombeteira veio:
‘eu vou viajar’
‘pra onde?’, perguntaram
‘japão’
‘quando?’
‘já’
‘e as coisas todas que
você tem que fazer aqui?’
‘ficam pra depois’
‘com quem você vai?’
‘sozinho, com alguém que me-eu queira e queira ir, não sei e não importa’
‘o que você vai fazer lá?’
‘perambular olhar ver saber
um pouco ouvir tocar...vou sentar em um izakaia em nagoya e vou ficar
amigo de uma mulher e a gente vai se apaixonar e vamos namorar até o dia em que
eu for embora e nesse dia vamos chorar...niponicamente’
‘você está delirando’
‘não, estou sonhando,
cruzarei o japão sonhando’
‘isso nunca...nada disso vai...e se
nada disso acontecer?’
‘então tudo isso terá
quase acontecido’
andrejcaetano